FCB Feminino

Di Stéfano: a Ditadura o fez 'merengue'

Nascido em Buenos Aires, no dia 4 de Julho de 1926 , um dos maiores ídolos da história do Real Madrid - por direito - deveria ter se tornado blaugrana em 1953, no mesmo ano em que ingressou na esquadra madridista



À esquerda, Ladislau Kubala - os dos maiores jogadores da
história do Barça - e a direita, Di Stéfano


Para entendermos bem essa história, vamos começar pelo regime franquista, e/ou, regime ditador imposto pelo General Francisco Franco entre os anos de 1939 e 1975 - coincidentemente um dos períodos mais "vitoriosos" da história madridista - que teve grande influência no crescimento econômico e estrutural do Real Madrid Club de Fútbol.



Segundo contam historiadores espanhóis, o regime do general Franco foi o responsável, inclusive, pela construção do Estádio Santiago Bernabéu, que comprovadamente foi pago pelo povo espanhol. Além disso, o então general, também teria tido papel fundamental nas cinco primeiras conquistas europeias do Real, influenciando desde a arbitragem, até na escolha dos adversários. Vale lembrar, que após a morte do general Franco, os 'blancos' levaram 32 anos para voltar a conquistar a Europa, de 1966 à 1998. Dito isso, vamos entender agora qual foi o papel de Franco na histórica disputa entre Real Madrid e Barcelona, pela contratação de Alfredo Di Stéfano.

O início da grande disputa:

Di Stéfano com a camisa do River Plate em 1947. 
Di Stéfano começou sua carreira no River Plate, clube pelo qual seu pai atuou nos anos 30. A incrível velocidade do menino de 17 anos, aliada a cor dos cabelos, fez com que ele rapidamente fosse apelidado de 'la saeta rubia' , em português: 'a flecha loira'. O jogador estreou no time argentino em 1945, no elenco que era conhecido como 'la maquina', por contar com as maiores estrelas do futebol argentino na época.

Com tantas estrelas no elenco do River, o jovem Di Stéfano foi emprestado ao também argentino Huracán, onde disputou 25 partidas, e marcou 14 gols. Em sua volta ao River Plate em 1947, Di Stéfano finalmente se firmou, e marcou 57 gols em 66 partidas, uma marca extremamente relevante para um jogador de apenas 20 anos.

Em 1949, devido a uma grande crise no futebol argentino, Di Stéfano - assim como vários outros jogadores da Liga do país - foi jogar no futebol colombiano, no Millonarios de Bogotá. E foi no futebol da Colômbia, que o jogador despertou o interesse dos gigantes espanhóis. Após três temporadas, 3 títulos nacionais, um futebol magnifico, muitos gols e uma evolução absurda pra época; uma excursão do time colombiano pela Espanha em 1952, começaria uma das mais ferrenhas disputas por um jogador na história do futebol.

Di Stéfano com a camisa do Millonarios em 1949.
Na mesma excursão, o Millonarios enfrentava o Real Madrid no Estádio Santiago Bernabéu. Foi quando o ex-jogador, na época olheiro do Barça, Pepe Samitier, assistia ao jogo e não teve dúvidas: o Barça precisava contratar aquela joia. O grande problema é que o então presidente 'merengue', Santiago Bernabéu, e o excelentíssimo Senhor General Franco; também estavam assistindo ao confronto.

O homem encarregado de efetuar a negociação foi o então diretor técnico 'blaugrana', Ramón Trias Fargas; que tinha a árdua missão de convencer o Millonarios, o River Plate e o próprio Di Stéfano. La saeta rubia, ainda tinha o passe vinculado ao River Plate, seu clube formador, o que dificultava muito a contratação.

As negociações entre o Barça, o jogador e o River Plate, foram extremamente tranquilas. O problema maior foi fechar com o time colombiano, que não gostou nada do fato de o clube catalão envolver o diretor técnico do Santa Fé; um velho amigo de Samitier, o colombiano Joan Busquets. Joan entrou na história para facilitar a logística, pois o deslocamento em 1952 estava muito longe de ser rápido. O Millonarios por sua vez, temeu que o diretor do rival estivesse trabalhando em benefício próprio, por isso tentou dificultar ao máximo a operação.

Em 1953, após uma excursão pela Venezuela, Di Stéfano informou ao Millonarios que não voltaria para a Colômbia, tentando forçar o clube a aceitar a oferta do Barça. As estratégias usadas pelos 'azulgranas' não foram muito inteligentes. A escolha de um diretor rival para conduzir na Colômbia e a fuga do jogador, deixaram os colombianos furiosos e decididos a não fechar com o Barcelona. No dia 17 de Maio de 1953, Di Stéfano e família chegavam à Barcelona. A imprensa espanhola já dava a contratação como certa, pois, se o Barça já havia comprado o passe do jogador junto ao River, o Millonarios não teria escolha,  e seria forçado a aceitar o dinheiro pela rescisão de contrato do argentino.

General Francisco Franco.
Percebendo o impasse, e contando com um importante aliado, o Real Madrid entrou na disputa por Di Stéfano. Um dos maiores jogadores da época, o húngaro Ladislao Kubala, era o grande astro do Barça em 53, e uma parceria entre ele e Di Stéfano tornaria aquele time quase imbatível; algo que não era visto com bons olhos pelo governo espanhol, que decidiu que o atleta deveria atuar no clube da capital, o Real Madrid.

O regime fascista do General Francisco Franco, ficou conhecido especialmente pela repressão á cultura da Catalunha. Por isso, o povo catalão utilizava o Fútbol Club Barcelona para se expressar. Aquilo incomodava demais o governo franquista, que tinha como grande apoiador o presidente do Madrid, o Sr. Santiago Bernabéu, que em uma dessas manifestações de repressão e preconceito, disparou a famosa frase: "Eu aceito e admiro a Catalunha, apesar dos catalães."

Quando as negociações entre Barcelona e Millonarios, finalmente pareciam estar avançando, a federação Espanhola decretou uma lei proibindo a contratação de jogadores estrangeiros. O fato de uma lei assim ter sido decretada, já era um bom motivo para desconfiar que algo não estava certo. A confirmação de que o Real Madrid, juntamente com o governo de Franco, estavam envolvidos nisso; veio quando a federação Espanhola apareceu na sede do Barça com a seguinte proposta: Di Stéfano seria a exceção a nova lei, com a condição de que o Barça aceitasse dividir o jogador com o Real Madrid por quatro temporadas, e depois disso, o próprio atleta decidiria seu destino. O Barça teria o argentino nas temporadas de 1954-55 e 1957-58, enquanto os merengues contariam com a joia em 1953-54 e 1956-57. Intimidado pela forte pressão, e sem saída, o presidente Barcelonista aceitou a oferta/imposição.

Em 15 de Setembro de 1953, os presidentes Martí Carreto (Barcelona) e Santiago Bernabéu, assinaram o acordo mais polêmico já feito na história desse esporte. Por pressão da diretoria do Barça, que não se conformou com o acordo, Martí renunciou ao cargo uma semana depois. A direção 'Blaugrana', antes mesmo de escolher o sucessor de Carreto, decidiu romper o acordo, entregando Di Stéfano ao Real Madrid. 

Os merengues pagaram ao Barcelona 4,4 milhões de pesetas (antiga moeda espanhola), para garantir legalmente a contratação do jogador. A história é contada até hoje pelos madridistas em tom de comemoração, mesmo sabendo que foi a ditadura quem lhes deu um de seus maiores ídolos.

Di Stéfano entrou em campo pelo Real Madrid 396 vezes, e marcou impressionantes 411 gols; média de 1,3 gols por jogo. O craque conquistou 6 vezes a Copa da Europa pelo Madrid -  com um luxuoso apoio do regime franquista -  sendo em todas as edições o grande destaque do seu time, e também do torneio.

O Barcelona perdeu sim um grande craque, mas esse foi só um pequeno capítulo do imenso lado negro da história 'blanca'. Don Alfredo, como era chamado, morreu em 7 de Julho de 2014, vítima de uma parada cardíaca. Um grande craque da história do futebol, que mesmo sem nunca ter entrado em campo com a camisa 'azulgrana', marcou seu nome da história do clube; mesmo que em um capítulo marcado pela opressão. Nem sempre é só futebol...